03/04/07

Charles & Peters Cafe

UM CONCERTO: THE PSYCHEDELIC FURS, NO COLISEU DOS RECREIOS (21/09/1991)

Não consigo precisar a idade que tinha quando aquele disco apareceu lá em casa. Talvez tu te recordes melhor do que eu. Pediste ao tio que te trouxesse de Nova Iorque, entre outros, o “Power, corruption and lies”, dos New Order. As minhas preferências musicais começaram a moldar-se por aí. Continuo a ouvir New Order, mas esse álbum, de 1983, é diferente e significa muito mais do que o meu simples gosto por uma banda. Na altura, era eu um puto novo, não imaginava a ligação que tinham com os Joy Division. Fui crescendo e aprendendo, muito mais sobre Joy Division, um pouco menos sobre New Order.

Tempos houve em que chegavas a casa e eu olhava para as tuas mãos. Se estivesse já a dormir, acordava. E se não me levantasse na altura, a primeira coisa que fazia de manhã era vasculhar o saco que trazias. O que procurava eu? Discos, claro. Todas as semanas. Por vezes às carradas. Vindos de um certo lugar. E, assim, fui fazendo as minhas escolhas. No fundo, acabaste por ser tu a alimentar-me o vício. Foste o portador do vírus. Que não me criem uma vacina, porque com esta doença convivo bem, obrigado. E, claro, este obrigado é para ti.

Que me ocorra, nunca assistimos a um concerto juntos. Nunca fizemos muita coisa juntos. Tivemos alguns desatinos, umas discussões, por causa dos nossos feitios diferentes, qual deles o mais especial de corrida. Nada de muito grave. Podemos até não ter, ainda, a melhor relação entre irmãos que existe, mas somos bons amigos. Dúvidas sobre isso? Nenhumas. E dúvidas não tenho que amigos nos manteremos. Estão proibidas mais confusões nesta família.

Para além de ti, existe o outro sócio deste bar. A maior parte das capas de vinil que me percorrem a memória auditiva, têm a mesma proveniência. O tal certo lugar que referi há pouco. Alguns dos discos ouviam-se muito na altura. Outros nem por isso. Era nesses, principalmente, que me fixava. “Sonic flower groove" e nunca os Primal Scream soaram tão diferentes, como ainda tentam soar a cada álbum que fazem. "The greatest story ever told", dos Balaam & The Angel, tão inesquecível que não o encontro em lado nenhum, e os acordes de "slowdown" intrometem-se-me de novo nos ouvidos. Os maxi-singles..."bring on the dancing horses" dos Echo & The Bunnymen, "books on the bonfire" dos Bolshoi, "uncertain smile" dos The The, "idol" dos Flesh For Lulu, "this corrosion" dos Sisters of Mercy...os Lp's, inumeráveis...Na noite de 24 de Dezembro de de mil novecentos e qualquer coisa, o pai natal trouxe uma aparelhagem da moda para pôr na sala. Açambarquei-a logo, e ali fiquei a ouvir os "meus" discos durante quase toda a noite. Ouvi "Darklands" dos The Jesus and Mary Chain umas duas ou vinte vezes seguidas. Era novidade. Mais tarde, o dono do certo lugar começou a gravar-me cassetes de música esquisita, com passagens entre cada música e tudo, era o melhor DJ lá da zona. Formou-se então a minha paixão pelas compilações, que ainda dura, pois dura. O DJ foi-se dedicando a outras músicas, embora, aqui e ali, continuasse a ser requisistado. Aqui, na Costa da Caparica, naquele fim de ano de caixão à cova, enchendo a pista de dança de uma vivenda com o melhor som, mas só até uma determinada hora, porque depois disso já não me lembro de nada. Ali, no moinho em Torres Vedras, alguns anos depois, o "1979" dos Smashing Pumpkins e uma cadeira a pregar-me uma rasteira. Os copos partem-se, mas a música continua, e continua, e continua...

Parabéns aos dois, obrigado por me terem deixado inventar este espaço. O Charles & Peters Cafe abriu há mais de 20 anos, mas a inauguração fica para amanhã. A primeira música a rodar será "your silent face". A meu pedido...

2 comentários:

Terceiro disse...

Oh "segundo" estás-te a esquecer daquela passagem de ano no armazém da mulher do outro sócio deste bar que também foi de caixão à cova. Sinceramente nem me lembro da música..... ou tu não estavas lá???? É que as recordações dessa noite são muito ténues...... seria do alcool???? Naaaaahhhhhhhhh.
E aquela na Costa da Caparica gostei muito, embora ache que a música estava demasiado calma. Cheguei talvez uma meia hora depois da meia noite e não havia viv'alma. Pareciam fantasmas. Assim como a música. Ou estaria eu surda????

Primeiro disse...

Uau !!!! Ainda hoje o tio me azucrina a cabeça por ter percorrido New York inteira à procura de um disco que haveria de encontrar num baú de uma qualquer discoteca.
Estavam a decorrer os vindouros anos 82/83. Eu teria os meus 16/17 anos e as noites do Bairro Alto começavam a despontar.
Ainda hoje este estado febril e de enfermidade musical se mantém. Durante 30 anos devo ter tido 42/43 graus de temperatura corporal.
Quanto ao "Charles&Peters Café" sempre foi um sonho. Mas, dá para se transformar em BAR?
Quanto às irmandades, amizades, inimizades, ades, ades , o que interessa (??????)....Adoro-te.
Obrigado e até já.